sexta-feira, agosto 19, 2005


“Yo soy revolucionario porque no hay verdadero poeta que no sea revolucionario"



Federico Garcia Lorca morreu a 19 de Agosto de 1936, em Vizna, Granada, nas mãos das tropas franquistas





A Casada Infiel
Garcia Lorca


Eu que a levei ao rio,
crendo que era uma donzela,
porém já tinha marido.

Foi na noite de Santiago
e quase por compromisso.
Apagaram-se os candeeiros
e alumiaram-se os grilos.
Já nas últimas esquinas
toquei seus peitos dormidos
e de pronto se me abriram
como ramos de jacintos.
A goma de sua anágua
soava no meu ouvido,
como um pedaço de seda
por dez facas destruídos.
Sem luz de prata nas copas
têm as árvores crescido
e um horizonte de cães
ladra mui longe do rio.

Passadas as amoreiras,
os juncos e os espinhos,
abrigando em seu cabelo
fiz um fojo sobre o limo.
Tirei eu minha gravata.
Tirou ela o seu vestido.
Eu o cinto do revólver.
ela os quatro corpetinhos.
Nem os nardos nem as conchas
têm pele de toque tão fino,
nem os cristais com a lua
reluzem com esse brilho.
Suas coxas se me escapam
como peixes surpreendidos,
por metade são de lume,
por metade são de frio.
Essa noite percorri
o melhor de tais caminhos,
montado em potra de nácar
sem bridas e sem estribos.
Não quero dizer, por homem,
coisas que ela ali me há dito.
A luz deste entendimento
faz-me ser mui comedido.

Suja de beijos e areia,
comigo a levei do rio.
Com o ar se entrechocavam
espadas feitas de lírios.
Portei-me como quem sou.
Como um cigano legítimo.
Dei-lhe um estojo de costura
grande de cetim palhiço,
e não quis enamorar-me
porque tendo já marido
me disse que era donzela
quando eu a levava ao rio.